08 janeiro 2009

O Ano Novo: O Despertador da Natureza

O Ano Novo é sempre aquele momento marcante em que as pessoas resolvem tomar grandes decisões:
“Vou parar de fumar”,
“Vou fazer dieta”,
“Vou praticar exercício físico três vezes por semana”,
“Vou mudar de emprego”,
“Vou marcar uma viagem”,
“Vou deixar de trabalhar tanto”,
“Vou passar a ver menos televisão”,
“Vou perseguir o meu sonho”,
(Aquele, o tal, o de sempre, o Sonho, escondido algures dentro de nós, imperceptivelmente escamoteado pela realidade),
“ Vou deixar de comer hambúrgueres e batatas fritas ao almoço”,
“ Vou começar a lembrar-me sempre dos aniversários dos meus amigos”.
“ Vou passar a ir ao médico”.
Etc, etc, etc.
Todas estas deliberações, que de comum têm o facto de serem objectivamente benéficas para a nossa vida, podem ser resumidas num:
“Vou-me tornar diferente”.

Não há dúvida que, nesta altura do ano, surge uma enorme necessidade em assumir novos compromissos perante nós próprios. Encaramos o Ano Novo como uma nova chance que a vida nos dá para recomeçar. Queremos tornar-nos naquilo que não somos e sempre quisemos ser.
Subitamente, como que acordados pelo despertador da urgência, começamos a ter pressa. Daí a súbita ansiedade, o desespero por não sabermos se ainda vamos a tempo, a motivação fulminante, Fazemos um balanço do passado e queremos refazer os erros, queremos embrenhar-nos finalmente nos caminhos proveitosos do certo, queremos tudo de uma vez.

As doze badaladas tocam nos sinos ancestrais das praças. Tampas e tampas de garrafas de champanhe irrompem com estrondo pelo ar festivo da noite. Comem-se passas. Grita-se. Salta-se. Dança-se. Um novo fôlego toma conta de nós. Pensamos na agenda ainda novinha em folha, completamente por estrear, cheia de dias e de horas em branco. Que tranquilidade é sentir que o nosso prazo de validade se prolongou, em princípio, por mais 365 dias. 365 alvoradas de possibilidades.
O Ano Novo traz Esperança. Finaliza um ciclo. É o carimbo oficial da vida que permite deitar o passado ao lixo e que atesta uma nova oportunidade.

Porque esquecemos então, à medida que os dias avançam e que o ano perde a frescura, todas as ideias fantásticas que decidimos pôr em prática?

... Talvez porque, infelizmente, a memória das emoções é sempre curta. Somos bons a recordar acontecimentos e a saber que, nesta ou naquela altura, fomos felizes, ou que em determinado momento a tristeza vacilou em nós como um baloiço em andamento. Mas não conseguimos sentir novamente essa felicidade ou essa tristeza. Apenas sabemos que, algures em nós e algures no tempo, elas existiram.
O mesmo se passa com o ânimo que surge nesta altura do ano. Lembramo-nos vagamente dele. Até podemos ter uma lista pendurada no frigorífico; um pedaço de papel rabiscado que acena timidamente na branca e fria porta que abrimos repetidamente ao pequeno-almoço. No entanto, já não sentimos qualquer impulso para a acção. O sopro diário da rotina imobilizou-nos. Começámos a acumular dias e dias às costas e o peso tornou-se tão grande que qualquer movimento se tornou perfeitamente impossível.

Só que esquecemo-nos que, se não conseguimos conservar as emoções, podemos sempre reviver os acontecimentos. Esquecemo-nos que o Ano Novo pode ser todos os dias.

... Uma das coisas mais importantes que eu aprendi na vida foi a arte da reciclagem diária. Eu não sou hoje exactamente aquilo que fui ontem, nem serei amanhã exactamente aquilo que sou hoje.
Acharmos a continuidade uma imposição da vida é algo que nos vai sempre roubar a liberdade.
Ser verdadeiramente livre é ser livre cá dentro, no âmago da consciência. E nunca nos prendermos nem ao tempo nem àquilo que fomos um dia.

O Ano Novo é só a forma que a Natureza encontrou de nos relembrar disto, de nos fazer ver que, quem nos acorrenta ao passado e quem tem o poder de nos dar umas novas asas para voarmos mais além, na direcção do horizonte sempre imaginado e nunca perseguido, somos sempre nós próprios.

1 comentário:

Anónimo disse...

Sara, o Jornal Alpiarcense agradece a tua colaboração e os leitores também.
Obrigado