13 novembro 2007

O retrato do desempregado que tem um curso superior

TER UMA LICENCIATURA SIGNIFICA maior facilidade em encontrar emprego. Ainda assim, 9,2% do total de inscritos nos centros de emprego estudaram na universidade.

Artigo de Susana Represas, publicado na edição de 9 de Novembro do Diário Económico

Num relatório inédito, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior revela quais são os cursos com maior número de desempregados com habilitação superior. Em primeiro lugar está a licenciatura em Formação de professores do ensino básico, com 2.737 desempregados, em Junho de 2007. O curso de Gestão e Administração surge em segundo lugar, com cerca de 2.500 habilitados nesta área que estão, neste momento, à procura de emprego.

Mas se tivermos em conta as áreas de estudo que reúnem todos os cursos com um programa semelhante, a Formação de Professores/formadores e Ciências da Educação regista a maior percentagem de licenciados desempregados, com 19% no total.

Seguem-se as ciências sociais e do comportamento, as ciências empresariais e engenharia, com 8%.

Os resultados, a que o Diário Económico teve acesso, foram publicados em Setembro de 2007, e decorrem do cruzamento de dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional, tutelado pelo Ministério do Trabalho, e do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, tutelado pelo Ministério do Ensino Superior.

Ainda assim, o relatório salienta que os licenciados continuam a ter maior facilidade em encontrar emprego quando comparados com desempregados com menos qualificações. No total, os desempregados que detém habilitação superior, representam apenas 9% do universo de desempregados, ou seja, 34.500 pessoas.

Para Seabra Santos, presidente do Conselho de Reitores, "é evidente que há uma franca vantagem em ter o grau de licenciado", mas o reitor da Universidade de Coimbra apela aos ministérios do Ensino Superior e da Economia a "que ajudem a mostrar às empresas as vantagens em empregar licenciados". Pedro Lourtie, ex-secretário de Estado do Ensino Superior, concorda que haja "maior facilidade em encontrar emprego, tendo um curso", mas deixa um alerta: "Cada vez mais o diploma é insuficiente e as competências são muito importantes" na inserção no mercado de trabalho.

Quanto à intervenção que o Estado pode ter nesta matéria, Lourtie diz não ser "favorável à restrição ao acesso a certas áreas de estudo", mas sublinha que "é fundamental dar informação às pessoas, mostrando as áreas em que há mais dificuldade em arranjar emprego". Por outro lado, lembra que o Governo pode, por exemplo, "evitar a publicidade enganosa que certas universidades fazem, nomeadamente algumas privadas". Já Fernando Seabra Santos diz que "o Governo deve ter medidas de forte regulação, para evitar a fraca qualidade de certos cursos".

O estudo aparece tarde, pelo menos para os alunos que entraram este ano no ensino superior, mas os autores deixam a garantia de que esta publicação será conhecida em Junho e Dezembro de cada ano e, em documentos próximos, deverão ser incluídos dados sobre as instituições de ensino superior de cada licenciado desempregado.

Empregos só aumentam para domésticas e serviços

O problema do desemprego tem vindo a ganhar contornos de maior gravidade, não só ao nível dos licenciados. Aliás, a intenção governamental de criar 150 mil novos empregos até ao final da legislatura é um objectivo que se antevê cada vez mais difícil de atingir.

Especialmente depois de Portugal conseguir, no segundo trimestre de 2007, ultrapassar Espanha no nível de desemprego. Os dados do INE mostram que Portugal é cada vez mais uma economia de pequenos serviços, pequeno comércio, negócios financeiros e tantos outros que giram em torno do fenómeno imobiliário, mas tem vindo a perder a base industrial, devido a uma nova lógica de concorrência global, mas também à carência de trabalhadores com médias e altas qualificações e iniciativas empresariais inovadoras. Apesar do baixo crescimento do produto e de o emprego estar estagnado desde 2002, há áreas que estão a criar postos de trabalho.

Segundo o INE, as áreas que mais empregos criaram no segundo semestre foram as actividades com empregados domésticos e de produção para uso próprio, os chamados outros serviços, com um crescimento de 11% face ao período homólogo. Logo a seguir, vêm as actividades imobiliárias e os serviços prestados às empresas - tão diversos quanto o aluguer de veículos, actividades informáticas, jurídicas, de contabilidade, de consultoria de gestão, segurança, limpeza industrial, embalagem, secretariado, organização de feiras, etc. -, que cresceram 10%.

MULHERES SÃO AS MAIS AFECTADAS PELO DESEMPREGO QUALIFICADO

O doutorado desempregado

Em Junho de 2007 existiam 64 doutores inscritos no Instituto de Emprego e Formação Profissional.

No total de desempregados com habilitação superior, os doutorados representam uma fatia marginal: apenas 0.2%. A grande maioria de desempregados com habilitação superior é licenciado, o que representa mais de 80% dos diplomados que estão inscritos nos centros de emprego. No que diz respeito aos grupos etários de licenciados à procura de emprego, a maioria está entre os 25 e os 34 anos. Já no caso das pessoas que têm o grau de doutor, a maior percentagem de desempregados está entre os 35 e os 44 anos.

Mulheres mais prejudicadas

A maioria dos desempregados inscritos nos centros de emprego com habilitação superior são mulheres. São cerca de 70%, contra 30% de homens. Esta tendência também se verifica no número de licenciados, onde as mulheres estão cada vez mais representadas, o que acompanha, de resto, a tendência demográfica. Por outro lado, diz o estudo, "a diminuição no total de desempregados com habilitação superior de 2006 para Junho de 2007 é particularmente manifesta no caso do género masculino, acentuando-se a supremacia estatística das desempregadas com habilitação de licenciada e grau de doutor".

Licenciatura não garante emprego

O facto de se ter uma licenciatura é, cada vez menos, um sinónimo de garantia de emprego. A prová-lo estão os dados do relatório sobre as taxas de empregabilidade dos cursos superiores, que dizem que "a situação de procura de primeiro emprego é bastante mais significativa nos desempregados com habilitação superior do que no total de desempregados".

Ainda assim, sublinha o relatório do Ministério da Ciência e do Ensino Superior, "a população com habilitação superior é menos atingida que a população em geral pelo desemprego de longa duração".

Norte lidera desemprego

Os desempregados com habilitação superior acompanham a distribuição geográfica do país e por isso concentram-se principalmente na capital, Lisboa, e na zona Norte de Portugal. De acordo com o estudo sobre a taxa de empregabilidade dos cursos superiores, como "a região de Lisboa é a que também concentra a maior parcela da população com habilitação superior", é apenas normal que "a intensidade da procura de emprego deste segmento populacional mais qualificado" seja, nesta área, "inferior à observada em todas as outras regiões" do país.

Comentário:

Tem razão o nosso Primeiro Ministro quando diz que "O" Emprego é o principal condicionante para o nosso desenvolvimento. É uma questão estrutural, e enquanto não olharmos para este assunto muito a sério é a mesma coisa que ir aplicando uns pensos ou dando umas aspirinas, que nem curam feridas e muito menos resolvem a doença.

Não sei se há soluções fáceis, e muito menos se há alguma solução, mas creio que deve ser coisa para ser feita para além do tempo de uma legislatura, pois mexer na estrutura de emprego de um País, mudar a estrutura de formação e o enquadramento empresarial das competências desenvolvidas na Academia, é matéria de longo prazo.

O que me choca sobremaneira é também o número de doutorados que estão inscritos nos Centros de Emprego. Já em relação aos licenciados, e à precariedade dos primeiros empregos, é interessante olhar para os anéis de curso que grande parte das operadoras de caixa das grandes superfícies comerciais ostenta.


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